A 6.ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que isentou de responsabilidade pela morte da menina Juliana Bonfim da Silva, de apenas 13 anos, os pais dela, que alegaram motivos religiosos para se opor à realização de uma transfusão sanguínea salvadora. Para o STJ, a responsabilidade pelo trágico desfecho foi exclusivamente dos médicos! Testemunhas de Jeová, os pais de Juliana internaram-na no Hospital São José, durante uma crise causada pela anemia falciforme, doença genética, incurável e com altos índices de mortalidade, que afeta afrodescendentes. A menina tinha os vasos sanguíneos obstruídos e só poderia ser salva mediante a realização de uma transfusão de emergência. Os médicos que atenderam Juliana explicaram a gravidade da situação e a necessidade da transfusão sanguínea, mas os pais foram completamente irredutíveis. A mãe chegou a dizer que preferia ter a filha morta a vê-la receber a transfusão. A vontade foi respeitada e a transfusão não foi feita. Fez-se a sua vontade. Para o ministro Sebastião Reis Júnior, a oposição dos pais à transfusão não deveria ser levada em consideração pelos médicos, que deveriam ter feito o procedimento -mesmo que contra a vontade da família. Assim, a conduta dos pais não constituiu assassinato, já que não causou a morte da menina. A decisão no STJ foi comemorada pelo advogado Alberto Toron, que defendeu os pais da menina morta: “É um julgamento histórico porque reafirma a liberdade religiosa e a obrigação que os médicos têm com a vida. Os ministros entenderam que a vida é um bem maior, independente da questão religiosa”. Então, quem é culpado pela morte da menina que poderia ter sido salva mediante a realização da transfusão?
Resposta: os médicos, que ao respeitar a vontade dos pais, desrespeitaram o Código de Ética Médica.
Isso posto, está claro que a decisão do STJ tem menos a ver com a afirmação do direito à liberdade de crença e muito mais a ver com a primazia do direito à vida sobre todos os demais. Assim, a mãe poderia até preferir ter a filha morta a vê-la passando por um processo de transfusão. Mas a Justiça brasileira, não! E o médico também não! Todas essas questões apontam para dilemas que não são meramente individuais, mas dizem respeito à saúde públic. E que Deus é esse?
Fonte: Rangel Garcia